Imagem: Davi Realle Heitor Vallim é natural de Santos, São Paulo, cidade costeira que se destaca pelas suas praias e areais extensos...

Heitor Vallim: Surf e Música, duas artes que se entrecruzam no caminho da reinvenção criativa

Imagem: Davi Realle
Heitor Vallim é natural de Santos, São Paulo, cidade costeira que se destaca pelas suas praias e areais extensos. Foi nesse ambiente muito próximo ao mar que Heitor começou a aprender a linguagem das ondas e a surfá-las. Para o músico, o surf é uma manifestação artística e não somente um desporto, acreditando que cada onda detém um conteúdo ou uma mensagem, assim como na música, o surf é também um veículo para a expressão artística. 

A música e o surf ocupam o cerne da mente criativa de Heitor e foi no mar que encontrou a inspiração para o seu mais recente EP intitulado L.O.S.T que marca uma passagem para um som mais virado, para o indie rock e o pop, destacando-se dos seus trabalhos anteriores, Naissance, Calvário e Insomnia que se alinhavam do lado folk melancólico e confessional. No entanto, a mudança não foi abrupta ou anti-natural, havendo já manifestações subtis de mudança de sonoridade no disco Calvário.

As mudanças fazem sempre parte de quem procura o seu caminho, musicalmente ou na vida pessoal, e Heitor Vallim está pronto para duas importantes passagens, a de se estabelecer num país diferente, Portugal, país em que aprecia as diversas formas de arte, no qual viverá a partir de 2020, e a passagem do seu som para um espectro mais indie pop, recheado de psicadelismo. 

- Heitor, começaste a tua carreira musical com Naissance, um folk bastante introspectivo, mas em Calvário já se notava uma certa mudança na sonoridade, com o uso de componentes mais electrónicos e pop. Essa passagem tornou-se ainda mais notória no teu último EP, L.O.S.T que se apoia muito na sonoridade indie, mas também algo pop. Como sentiste esse processo de mudança na tua sonoridade?
Heitor Vallim: Foi algo extremamente natural. À medida que fui entrando no mundo da música, comecei a me deparar com diversos estilos e sons que nunca tinha ouvido e sentia a necessidade de agregar no meu trabalho.

"O surf é outra maneira que consigo me expressar. Fazer surf é como fazer balé ou qualquer outra expressão corporal. Tem toda uma mensagem em cada onda que pega assim como a música. Sou dos adeptos que o surf é uma manifestação artística que pode ser usada como esporte por se tratar de algo que faz bem ao corpo, não somente esse segundo como muitos dizem."


- Vens de Santos, um município no litoral de São Paulo que se destaca por ter cerca de 7 kms de praia e um dos maiores jardins frontais à praia a nível mundial. Como foi crescer tão perto do mar e em que medida é que isso te inspirou a nível musical?Heitor Vallim: Posso afirmar com toda a certeza do mundo que a minha música é influenciada pela minha vida na praia. Sempre fui um amante dela e a vejo e vou praticamente todos os dias. Santos é uma cidade gostosa de se viver e as pessoas que vivem aqui tem um estilo de vida muito particular de enxergar as coisas. Isso é bem reflectido no meu som, acredito eu.

- Assim como a música, o surf também dá azo a momentos de contemplação e depois de um dia de surf, sentimo-nos em paz connosco e com o mundo. Como sentes a relação entre surf e música e que aspectos achas que têm mais em comum?
Heitor Vallim: O surf é outra maneira que consigo me expressar. Fazer surf é como fazer balé ou qualquer outra expressão corporal. Tem toda uma mensagem em cada onda que pega assim como a música. Sou dos adeptos que o surf é uma manifestação artística que pode ser usada como esporte por se tratar de algo que faz bem ao corpo, não somente esse segundo como muitos dizem. Para melhor entendimento indico o livro do vencedor do Pulitzer, Willian Finnegan, “Dias Bárbaros: Uma vida no surf”.

- Além do surf e da música, que outras actividades, sejam elas artísticas ou não, te preenchem?
Heitor Vallim: Sou um apreciador de todas as vertentes artísticas, mas ultimamente tenho me arriscado nas colagens e animações digitais. Apenas por diversão.










 "O objetivo de toda viagem é encontrar algo, certo? O estar perdido é na verdade a opção de ter escolha. Continuarei trabalhando com música e arte, mas sem conhecer o caminho ainda, mas sabendo que devo e vou me reinventar nele."


- Em L.O.S.T colaboraste com outros músicos e tocaste sintetizadores e guitarra, além da voz. No início do teu percurso, enquanto músico, qual o primeiro instrumento que tocaste e que bandas te influenciaram mais e fizeram com que te apaixonasses por música?
Heitor Vallim: Meu primeiro instrumento foi o violão, mas minha formação musical foi feita a partir do violino em um projecto gratuito da minha cidade feito pela marca Pão de Açúcar. Quando era pequeno lembro-me muito bem do meu, tocando All Of My Love do Led Zeppelin e Year Of The Cat do Al Stewart, acho que essas memórias sempre me fizeram querer tocar algo.

- L.O.S.T assim como pelo seu título e as músicas “Going Home” e “Me encontrar” parecem expressar um certo sentimento de estar ou sentir-se perdido, mas, ao mesmo tempo, também persiste uma necessidade de encontrar um caminho tanto interior quanto exterior. Qual é o caminho que sentes ser o teu neste momento da tua vida enquanto músico e ser humano?
Heitor Vallim: Pergunta difícil! No momento devo “me encontrar” trilhando o meu caminho com a minha futura esposa rumo ao desconhecido que me é o destino. O objectivo de toda viagem é encontrar algo, certo? O estar perdido é na verdade a opção de ter escolha. Continuarei trabalhando com música e arte, mas sem conhecer o caminho ainda, mas sabendo que devo e vou me reinventar nele.

- Lost in Home é o último tema do EP e tem um cariz um pouco melancólico, mas que exala paz de certa forma. O que representa e o que queres transmitir com esse tema?
Heitor Vallim: Muito bacana dizeres isso. É exactamente isso. Eu só tinha o instrumental até o momento da gravação e essa música de alguma maneira estava atrasando as gravações. Me obriguei a escrever na hora da gravação a letra dela. Eu tinha reencontrado uma pessoa que nunca deveria ter me separado e acabado de voltar de uma bela sessão de surf. Então é exactamente isso. A melancolia que se tornou paz.

- Em L.O.S.T também produziste e gravaste no Red Studio e no teu home studio. É importante para ti teres essa independência e sentes que tens mais liberdade para criar o teu mundo musical?
Heitor Vallim: Sim! Totalmente, inclusive eu trabalho no Red Studio, então foi tudo praticamente feito em casa.

Imagem: Davi Realle







- Em Dezembro mudar-te-ás aqui para Portugal, essa mudança acarreta novos desafios e experiências novas. O que mais anseias e queres experimentar/conhecer neste país?
Heitor Vallim: Não vou mais em Dezembro por motivos de maior planejamento, adiado para o início de 2020! Gosto muito das artes produzidas em Portugal. Desde as visuais às musicais. Tenho diversos conhecidos e amigos por aí e sempre quis desbravar o país com arte e surf!

- O que mais te motivou e inspirou para essa mudança de país? Foi resultado de alguma insatisfação com as políticas do governo do Brasil ou por outra razão pessoal? Como achas que a tua geração vê ou pensa o futuro do Brasil?
Heitor Vallim: Ambas as coisas! De facto o momento político brasileiro é medonho e desastroso. Somos governados por um presidente completamente despreparado e maluco. Minha companheira possui a cidadania e família em Portugal e gostaríamos de construir nossa vida no outro lado do Atlântico.

- L.O.S.T vai estar disponível a partir de 30 de Outubro. Que outros projectos futuros tens em mente que possas e queiras divulgar?
Heitor Vallim: Em breve penso em lançar mais um trabalho instrumental! Ainda em construção! Obrigado ao Acordes de Quinta pela entrevista muito bacana e perguntas que me fizeram questionar-me e pensar bastante. Agradeço o espaço e parabéns pelo trabalho!

Texto e entrevista: Cláudia Zafre
Entrevistado: Heitor Vallim 
Imagens: Davi Realle 
https://heitorvallim.bandcamp.com
http://smarturl.it/epLOST
streaming: https://album.link/br/i/1485205654