A premissa There’s beauty in the Darkness pode ser um quanto pesada para quem foge da negritude para procurar luz. A verdade é que não há b...

Rena Natalia, aka Mimi N, descreve por imagens o que lhe vai na alma com Sun Project

A premissa There’s beauty in the Darkness pode ser um quanto pesada para quem foge da negritude para procurar luz. A verdade é que não há balanço sem as duas, já diz Haruki Murakami:
Onde há luz tem de haver sombra, e onde há sombra é forçoso que haja luz. Não existe sombra sem luz, nem luz sem sombra.

Pois entenda-se que uma vida madura precisa de percalços para ter valor. Caso contrário estar-se-ia a viver no mundo Disney, numa ilusão fechada em muralhas.

Rena Natalia, que se utiliza do pseudónimo Mimi N, descreve por imagens o que lhe vai na alma com Sun Project. Muitas delas retratam realidades sociais que acontecem entre paredes e fora delas. Namorados que oferecem ramos de flores, mas que anseiam por dar a primeira facada, adições a psicofármacos, acefalia intelectual, promovida e estimulada pela alienação social, distanciamento social, traições na amizade, vários tipos de mau trato, ideação suicida; é só enumerar uma lista de problemas pessoais e sociais que acontecem em todas as partes do globo. 

A criativa auto-descreve-se como animadora e cenógrafa, dark art hobbyist, e idealista de manga. Apesar de ter como hobby o seu projecto Sun Project, consegue, com paixão e autenticidade, dedicar-se ao que gosta, pouco lhe importa existir artisticamente com os olhos postos no caminho mercenário, porque uma idealista jamais vende a sua alma.

    Liar © Mimi N - Sun Project


A temática que muitas vezes desenvolves é activista, uma vez que quase sempre subentende-se uma crítica ou um apontamento de crítica social. Como desenvolves as ideias, são encomendas ou tens liberdade para as desenvolver?
Muitas pessoas têm-me perguntado porque desenvolvi este projecto e honestamente nada é mais do que o daydreaming quotidiano de uma artista, os seus sentimentos e divagações. Não há motivo ulterior. Eu gosto de desenhá-lo, especialmente as personagens.

Existe também uma poética envolvente. Por exemplo, no âmbito do projecto Sun, o título do quadro “I am not crying” surge como contrassenso à imagem. Jogas muito com paradoxos. Esse lado mais poético faz com que o sentido ganhe outro valor?
Não é assim um nível tão elevado, mas acredito que há muita ironia quase inata presente na humanidade mesmo que não nos apercebamos disso sempre. O que dizemos e o que fazemos podem ser bem diferentes, especialmente nesta época em que vivemos da internet.

© Mimi N - Sun Project

Há muita dor no teu trabalho. De que forma é que uma imagem consegue minimizá-la, quando quem a vê se identifica com o objecto?
Não sei como responder a isso, visto que eu só desenho o que quero desenhar. É bom que de certa forma consiga aliviar a dor de algumas pessoas, mas sinto-me mais feliz se elas conseguirem superar e ser mais felizes no futuro.

Sentes que tens responsabilidade acrescida na medida em que as imagens podem valer mais que mil palavras?
Desde que as pessoas saibam que não pretendo traduzir maldade através delas, tudo está bem.

O ocidente como o oriente mais ocidentalizado são flagelados pelos problemas sociais. E isso é mais que evidente nos teus desenhos Sunpro. Sempre foste uma pessoa observadora e crítica, ou esse lado começa a assumir-se conforme te vais focando no projecto?
Mais do que ser observadora ou crítica, eu pergunto-me sempre na pele de um ser humano normal, é difícil sentires-te vivo, mesmo com os privilégios que tenho, e depois penso "e todas aquelas pessoas que vivem vidas muito mais difíceis que as minhas?", é um bocado por aí.

Quais são as tuas referências artísticas que consciente ou inconscientemente imprimes ao teu trabalho?
Não sei bem como responder a isso... mas os modelos para os meus desenhos são baseados nos meus comic originais e gostam de usar lenços e roupas elegantes.

Como tens lidado com esta pandemia? Tens estado activa?
A pandemia não me afecta muito, excepto que já não posso estar com os meus amigos, por isso, provavelmente, a falta de socialização.

Auto-descreves-te como uma artista vulgar e idealista. Como retratas o teu idealismo?
O meu idealismo revela a verdade da beleza e fealdade (da humanidade). As pessoas costumam ver-me como alguém pessimista. Ironicamente, ignorando/esquecendo outras imagens "positivas" que faço, incluíndo artes que não sejam Sunpro. E também é a realidade presente. Temo-nos focado demasiado nas notícias negativas. Provavelmente a minha arte também.


© Mimi N - Sun Project 

Quanto tempo passas à volta de uma personagem ou de um comic?
Fazer comics é muito exigente, não sei quantas horas passo a fazê-lo. Já para as personagens, depende do tipo de arte a que te referes. Mas varia entre meia-hora e um mês.

Tens alguma ligação à música? O que andas a ouvir nesta temporada?
Depende do estado de espírito. Às vezes, ouço música clássica, outras vezes canções pop dos anos 90, instrumentais ou bandas sonoras de anime/jogos ou canções vocaloid.

Intro e Entrevista: Priscilla Fontoura
Artista entrevistada: Rena Natalia
Tradução: Cláudia Zafre