Quem ouve o nome Paul Thomas Anderson associa inevitavelmente a Radiohead, a banda do frontman Thom Yorke. O rigor e a criatividade do realizador reflectem-se, desta vez, em ANIMA, um mini-documentário musical e performático, lançado na Netflix, que foi pensado, ensaiado e planificado com detalhe e sensibilidade; cujo conteúdo parte da solidão para o encontro, melhor dizendo, da sonolência para o amor. Thom Yorke é o protagonista que opera em contraste com o grupo de dançarinos.
Numa das conversas entre Thom Yorke e Zane Lowe, a propósito de ANIMA (nome que deriva de um conceito criado por Carl Jung, e título do seu terceiro álbum a solo produzido por Nigel Godrich, para a XL Recordings, editora que o lançou), o tema do sono é explorado e momento em que Thom admite ser obcecado pelo livro Why we Sleep, de Matthew Walker.
Aquando de uma digressão que o levou à exaustão pela falta de sono entre concertos, o músico começou a pesquisar sobre o assunto. Movido pelo tema, afirma que se não dormirmos o suficiente não processamos o bastante, porque é no estado de sono profundo que desenvolvemos as ideias mais criativas, foi assim que cientistas e músicos desenvolveram as suas melhores ideias. Por sua vez, explica que existem dois tipos de sono, um que passa pela desfragmentação no nosso disco interno, em que o cansaço não é regenerado; e o REM, compreendido por ser o sono profundo, em que os olhos e os músculos fazem pequenos movimentos. É durante esse período que a maior parte dos sonhos ocorrem. REM é a abreviatura de movimento rápido do olho. Existe mais actividade no cérebro quando estamos no sono REM do que quando estamos despertos.
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Nesse estado de ausência aparente, Anima causa no espectador um bocejo e assim se entra no sonho que brinca com sombras e luz, com a ilusão óptica do espaço. As sensações transmitidas pelo veículo do corpo são reflectidas pelas imagens coleccionadas nos sonhos. Anima procura conexão e encontra o amor. Nesta obra de 15 minutos, que é iniciada num comboio onde se sentam passageiros vestidos com uma farda, existe uma mulher que prende o olhar de Yorke.
Anderson presta homenagem às comédias dos filmes mudos dos anos 1920, incluindo elementos surreais e faz alusão às coreografias de Yoann Bourgeois. Anima é construído com um sonho de três partes, mas é ao mesmo tempo uma espécie de comédia. Yorke apaixona-se pela mulher (na realidade é a actriz e sua companheira Dajana Roncione) que se esquece do seu almoço no comboio, e Yorke persegue-a para o devolver. Há uma espécie de final feliz que representa o lado romântico presente em "Punch Drunk Love".
Anima também aborda a influência que os dispositivos móveis exercem no comportamento humano: “Nós começámos a imitar o que os nossos aparelhos dizem sobre nós e a adoptar esses comportamentos. É por essa razão que vemos alguém como Boris Johnson a dizer mentiras e a prometer algo que nunca vai cumprir. Não precisamos de conectar directamente com ele, é apenas um avatar. As consequências do que fazemos não são reais, nós permanecemos anónimos. Enviamos os nossos avatares para abusar e lançar veneno e depois regressamos para o anonimato.”.
Enquanto obra visual, Anima não se dissocia da composição sonora; o encontro audiovisual é uma mensagem abstracta que só pode ser entendida por quem procura no sonho a ponte para as suas criações.
Filme: Anima
Imagens: Frames do filme Anima (2019)