Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi, (2015), e a recuperação do arquivo palestiniano

Introdução:

Nos tempos que correm convém ser imparcial, principalmente para a publicação de textos, uma vez que o politicamente correcto costuma ser a porta larga e facilitista para "chamar" meio mundo a convencer-se de algo que resvala sempre no imediatismo. Certo é que é inevitável existir, em todos e todas, uma tendência, política, ideológica, filosófica, humanista - não fôssemos humanos forçados a fazer constantes escolhas. 

A investigação rizomática começa a partir do século XX a fazer parte do modus operandi nas secções intelectuais da sociedade — pois não há tempo a perder — em detrimento da profundidade e investigação necessárias que resultam em opiniões com mais propriedade — o primeiro funcionamento altera o funcionamento e o poder das mentalidades colectivas. Por conseguinte, acabam por levantar problemas sérios, sendo um deles o enfraquecimento do pensamento crítico mesmo que se tenha mais acesso à informação, e mesmo que a informação que se vai adquirindo seja falsa, isto é, desfasada da realidade, não são todos os que pesquisam para perceber a sua fidedignidade. 

Cartaz do documentário Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi, (2015)

Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi 

Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi, parte de arquivos de imagem entre 1960 e 1980 do período da revolução palestiniana para mostrar um lado desconhecido. Segundo o realizador, o filme é mais sobre sentir do que ver. Foi realizado em 2015 do arquivo cedido por inúmeras pessoas. Apesar do realizador ter nascido na Palestina, pouco sabia do conflito israelo-palestiniano e da história do seu país depois do Tratado de Paz assinado pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e Israel.

O realizador, assim que saiu do seu país de origem para estudar noutro, foi abordado por um professor que foi ao seu encalço para inquirir sobre a existência de um famoso combatente palestiniano. Levado pela curiosidade foi pesquisar mais sobre a história da Palestina. Em Londres debruçou-se sobre o conflito e começou a pesquisar. Existiam poucos filmes online sobre acontecimentos relacionados com o conflito, apenas dois, e conforme ia pesquisando, mais informação ia obtendo. Mediante a sua curiosidade pelo tema, muitas pessoas à volta do mundo voluntariaram-se para cederem imagens. A versão do filme exibido é o sexto corte de montagem e fruto de três anos de recolha de imagens e selecção de material. A montagem durou 3 anos.

Em 1948 dá-se o conflito israelo-palestiniano com a declaração da independência de Israel — gerando problemas com a partilha de territórios. Duas décadas depois dá-se a revolução palestiniana. Nesse sentido, o documentário narra a identidade de um povo que se assume também a partir do registo que faz de si mesmo; na verdade não há grande registos da identidade palestiniana, os arquivos que existem estão espalhados no mundo e a identidade patente no documentário é de guerrilha e não cultural, segundo a descrição do realizador.

Nas escolas palestinianas o hino nacional da Palestina continua a ser cantado e fala-se sobre o direito à libertação – revêem-se na luta cubana Che Guevarista, uma luta de esquerda. O realizador deixa a questão, como é que se passa a memória de guerrilha a uma sociedade que precisa de se auto-reconstruir? O filme discursa também sobre o lado traumático que, neste contexto, é rejeitado, uma vez que os palestinianos deixam-se afectar menos pelos traumas e envolvem-se mais pela questão política. 

frame do documentário Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi, (2015)

Recuperação do arquivo palestiniano

Existem artigos científicos publicados em que é discutida a possibilidade da existência de materiais, imagens e arquivos palestinianos, visuais e outros, apreendidos ou saqueados por soldados israelitas, desde as primeiras décadas do século passado. Na perspectiva de pressionar o desbloqueio desse material, nascem projectos que se insurgem para recuperar esses dados escondidos e trazer à superfície a identidade palestiniana. Mais propostas têm sido realizadas com o intuito de requerer material apreendido aos seus proprietários legais à face da esfera pública.

Um dos actos de pilhagem de Israel foi o arquivo de filmes palestinianos saqueado pelas forças militares israelitas em Beirute em 1982. A sua recuperação conduz ao conhecimento dos contextos históricos da época, ao encontro dos cineastas do chamado terceiro movimento de cinema da Palestina e das várias instituições que fizeram parte da revolução na década de 1970, com foco na secção de Artes Culturais ministrada por Ismail Shammout. As projecções de filme de Jerusalem in my Heart são um exemplo de como performances ao vivo promovem a identidade visual de contextos históricos deixados ao esquecimento, a dupla Radwan Ghazi Moumneh e o cineasta Charles-André Coderre utilizam imagens de arquivo da Arab Image Foundation nos concertos. Mais documentários abordam o tema e apontam para a responsabilidade moral e ética na devolução do arquivo, exemplo é o documentário de Rona Sela Looted and Hidden – Palestinian Archives in Israel; "O material deve ser devolvido. Tal como Israel está continuamente a lutar para recuperar todo o material dos judeus saqueado pelos nazis, afirma a curadora, investigadora de história visual e cultura e docente na Universidade de Tel Aviv.

Sobre o realizador Mohanad Yaqubi

Mohanad Yaqubi tem firmado o seu percurso na realização e produção de filmes, e é um dos fundadores de uma produtora importante em Ramallah, a Idioms Films. Yaqubi é também um dos fundadores do centro de pesquisa e curadoria do colectivo Subservise Films que tem como foco as práticas de filme militante. De momento é investigador residente da Royal Academy of Fine Arts (KASK) em Gante, na Bélgica.

O primeiro filme de Yaqubi Off Frame AKA Revolution Until Victory foi estreado no TIFF - festival Berlinale.

Texto: Priscilla Fontoura

Documentário: Off Frame AKA Revolution Until Victory, de Mohanad Yaqubi. Exibição no Porto/Post/Doc

Mais informação: Haaretz