O programa de hoje dá a escutar a conversa com os Triciclo Vivo : músicos que tocam os seus temas na rua. Talvez, seja este o modus operandi...

Em nome da arte democratiza-se o centro da cidade. Não há bilhete de entrada para um evento sem hierarquias, a rua é o palco dos Triciclo Vivo


O programa de hoje dá a escutar a conversa com os Triciclo Vivo: músicos que tocam os seus temas na rua. Talvez, seja este o modus operandi mais democrático, pois não há bilhete de entrada para um evento mais horizontal, quem andar pela rua poderá ter a sorte de poder ver e escutar, sem qualquer impedimento, as criações do duo talentoso Miguel Almeida (bateria) e Ricardo Martins (baixo eléctrico). A rua é o lugar de possíveis encontros, qualquer pessoa de qualquer extracto social pode, por acidente, "dar de ouvidos" com concertos não sujeitos a organizações nem programações externas. Em determinada rua ecoam vibrações que acabam, inevitavelmente, por convidar ou despertar a curiosidade de quem por ali passeia. O acaso é, portanto, mais surpreendente e imediato quando o recurso à internet ou a outro meio qualquer pode não possibilitar esse encontro. 


Triciclo Vivo live feat. João MortáguaIlha da Fantasia

A análise realizada por Natália de Almeida Figueiredo, com o título Música de rua e ocupação de espaço público em São Paulo, ressalta as seguintes considerações: 
"O cidadão tem acesso a uma manifestação artística cada vez mais rica e diversa em diferentes momentos de sua rotina diária, como também o artista ganha uma nova possibilidade de exercer a sua actividade de uma maneira mais independente. Ao caracterizar-se como uma arte que ocupa e ressignifica o espaço público, a música de rua ganha um aspecto político e social. Observa, portanto, a um contexto histórico no qual esses mesmos espaços são tomados de um carácter privado, restrito e financeiro, perdendo cada vez mais as possibilidades de sociabilização e de encontro.

A arte dos músicos de rua que este público pode desfrutar está livre do controle e restrições que os grandes agentes fazem de qualquer informação e forma simbólica transmitida pelos média. Os transeuntes que são abarcados com a chance de desfrutar de uma apresentação só a aceitam se realmente são tocados pelo trabalho. Assim sendo, a mensagem do artista chega de forma livre de interesses, assim como o público que consome essa mensagem a recebe de livre e espontânea vontade, criando afinal, uma nova maneira de relacionamento público-artista. Feito neste ambiente de ocupação, ambos se beneficiam como cidadãos. Outra característica dessas relações é que são mais horizontais, diferente de situações onde há o palco e o artista é uma espécie de 'semideus'. O artista contribui disponibilizando o seu trabalho para um amplo público, livre das catracas invisíveis de certos ambientes como salas de espectáculos e concertos, e beneficia-se ao poder divulgar o seu trabalho, que é assistido pelo público e divulgado por esses nas suas redes sociais. Outro carácter transformador da música de rua é a sua capacidade de se inserir na rotina do cidadão por meio de uma arte que pode tocá-lo num momento inesperado. Assim, a música de rua torna-se uma maneira de humanizar a cidade, com o seu forte poder simbólico de tocar os transeuntes.

O espaço público ganha ressignificação que é promovido pela música de rua, aproximando tanto o artista como o público do conceito primordial de cidadania, a arte de rua pode até mesmo ser considerada como um acto político e uma arte-activista, torna-se fundamental para a humanização da cidade, transforma e anima a urbe e recuperação o direito do cidadão."

Locução e edição: Priscilla Fontoura
Interlocutores: Triciclo Vivo (Miguel Almeida e Ricardo Martins)